POR UMA EPISTEME DE FRONTEIRA
PROPOSIÇÃO PARA O ESTUDO DAS RELAÇÕES INTERCULTURAIS NA FORMAÇÃO DE IDENTIDADE NO ALTO SOLIMÕES
Palavras-chave:
Identidade de fronteira; Episteme de fronteira; Transfiguração epistemológica; Decolonialidade; Relações interculturais.Resumo
Este artigo tem por objetivo a proposição de um arcabouço teórico para
o estudo das relações interculturais na formação de identidade na região do Alto
Solimões, no noroeste do Estado do Amazonas, tríplice fronteira Brasil-PeruColômbia. O estudo se insere no conjunto dos estudos sobre fronteira, e, dentre
estes, na tensão entre fronteira física e fronteira simbólica. O método de abordagem
é hipotético dedutivo e se dá por meio de estudos exploratórios. Iniciamos, como
foco de análise comparativa, com os estudos sobre cultura da infância Xetá, tratada
pela Sociologia da Infância. Essas crianças indígenas do Sul do país, sujeitos
culturais de fronteira simbólica, por excelência, por viverem duplamente
conectadas entre dois mundos – o geracional e o não-indígena, resistiram
culturalmente ao esbulho de seu território, à tentativa de extermínio de seu povo e
à dispersão forçada, demonstrando a força cultural de sua episteme. Defendemos
que, de forma similar, a formação de identidades no Alto Solimões se dá a partir de
epistemes próprias, alicerçadas na dinâmica de cultivo de experiências culturais e
epistemológicas na produção da vida nesses espaços geopolíticos e de pluralidade
linguística, cultural, epistemológica e ontológica. Algumas dificuldades se colocam
no processo, como a pressão hegemônica da sociedade não-indígena, culturalmente
homogeneizante, e a pressão da ética competitiva de mercado que induz ao
identitarismo – ou à formação de territórios segregados de poder como afirmação
da identidade de grupo. Para superação desse quadro, propomos a Educação
Intercultural, o que torna necessário o aprofundamento dos estudos sobre relações
interculturais na região e a consolidação de um arcabouço teórico para apoiar tais
estudos. Para situar os povos do Alto Solimões na dinâmica histórica da ocupação
europeia dos espaços geográficos e simbólicos da América Latina propomos os
estudos sobre decolonialidade; e sobre a resistência epistêmica e insurgente desses povos à pressão cultural da sociedade não-indígena propomos os estudos sobre
memória coletiva e formação da identidade da Psicologia Social e os conceitos
antropológicos de etnogênese e transfiguração epistemológica. A relevância do
presente estudo está na possibilidade de abrir novas perspectivas de pesquisa e no
apoio à proposição de políticas públicas isonômicas.