GAMELEIRA, UMA ENTRE TANTAS HISTÓRIAS DE (IN)JUSTIÇA SOCIOAMBIENTAL NO LESTE MARANHENSE
Palavras-chave:
perícia ambiental, injustiça socioambiental, antropologia por demanda, etnografia nos/dos interstícios, comunidade de Gameleira, MaranhãoResumo
A situação vivida pela comunidade tradicional de Gameleira, localizada no Bioma Cerrado, entre os municípios de Milagres do Maranhão e Brejo, região Leste do estado, se soma a muitos outros casos de violências e despossessões sofridas por povos e comunidades tradicionais no Brasil diante do avanço do grande capital sobre áreas rurais. A persistência de um conflito entre as famílias de Gameleira e um empreendimento sojicultor, tensionada por tentativas de expansão e ocupação de uma área coletiva da comunidade, agravaram impactos anteriores sobre os recursos naturais, comprometendo práticas tradicionais de aprovisionamento alimentar. Perícia socioambiental demandada pela Defensoria Pública do Estado do Maranhão junto a grupos de pesquisa da Universidade Estadual do Maranhão, constatou as consequências socioambientais negativas da expansão do empreendimento e a noção de “injustiça socioambiental” se comprovou estratégica para traduzir e expressar a complexidade dos ataques sofridos pelo conjunto de comunidades rurais que, secularmente, ocupam e produzem em vastas regiões do Maranhão, hoje ameaçadas pelo uso indiscriminado de defensivos agrícolas e tentativas abusivas e violentas do agronegócio para expropriação de terras coletivas. Esta conflituosa situação convida a refletir sobre questões metodológicas adequadas a cenários de violências sofridas por grupos sociais que, em situação de vulnerabilidade diante da hegemonia do discurso do desenvolvimento, são postos numa correlação de forças assimétrica perante seus antagonistas que, manejando recursos políticos e econômicos, têm levado a perdas dos recursos naturais indispensáveis à reprodução de suas vidas e, consequentemente, à permanência em suas terras tradicionais. Para tanto, categorias como “antropologia por demanda” (SEGATO, 2021) e “etnografia nos/dos interstícios” (MUNIZ, 2023), expressão de práticas de pesquisa ética e politicamente implicada em construir coalizões com coletividades historicamente subalternizadas, foram acionadas para construção da perícia socioambiental e se mostraram como caminho capaz de argumentar junto ao Estado, resultando em decisão judicial favorável aos direitos coletivos de Gameleira sobre suas terras ancestrais.